A Segurança Social pagou quatro milhões de euros em pensões de sobrevivência e de direito próprio a beneficiários já falecidos, nalguns casos há mais de 10 anos, segundo apurou uma auditoria do Tribunal de Contas hoje divulgada.
A auditoria centrou-se nas prestações por morte cessadas em 2016 e 2017 tendo "detetado pagamentos indevidos de pensões de sobrevivência e de direito próprio a falecidos".
Deste valor, 3,7 milhões de euros correspondem a pensões de sobrevivência cessadas naqueles anos, enquanto cerca de 0,4 milhões são relativos a pensões próprias.
Entre os 223 casos de pensões de sobrevivência cessadas em 2016 e 2017 e analisadas, há 40 em que o óbito tinha ocorrido há mais de 10 anos e 35 em que contava já com mais de seis anos.
Não é a primeira vez que o Tribunal de Contas verifica este tipo de situações, sendo que a presente auditoria o leva a concluir que, além destes casos persistirem, o Instituto de Segurança Social (ISS) não instituiu os mecanismos para controlar estas situações nem assegurou a recuperação dos valores pagos de forma indevida.
A auditoria permitiu ainda verificar que daqueles 3,7 milhões de euros, houve uma parcela de 1,8 milhões de euros que foi registada como dívida, tendo sido recuperados 614 mil euros (16,7% do total).
Os restantes 1,9 milhões de euros "não foram registados como dívida quando foram cessadas as pensões, nem foram desencadeados quaisquer procedimentos tendentes à sua recuperação", facto que "é suscetível de gerar responsabilidade financeira punível com multa para os membros do Conselho Diretivo do Instituto da Segurança Social e para o diretor do Centro Nacional de Pensões", refere o relatório da auditoria.
Esta situação fez com que o número de processos de cobrança coerciva tenha caído de 1,4 milhões de euros em 2015 para 0,8 milhões de euros em 2017. "Por incapacidade de identificar o devedor responsável pela restituição dos valores recebidos indevidamente, parte significativa dos processos de dívida são arquivados, ficando a aguardar o decurso do prazo de prescrição", precisa ainda o Tribunal presidido por Vítor Caldeira.
O TC conclui também que os procedimentos de registo e confirmação de óbitos que são usados "não previnem o pagamento indevido de prestações", e exemplifica com as situações em que a morte foi considerada para acabar com a pensão por direito próprio, sem que o mesmo fosse feito à de sobrevivência, apesar de o beneficiário ser o mesmo.
No exercício do contraditório, o ISS sublinhou que as pensões de sobrevivência e as próprias não se encontravam aglutinadas pelo que não era possível fazer o "arrasto" do óbito.
Em 2017, estavam em pagamento 740.631 pensões de sobrevivência, havendo 9.047 que estavam a ser pagas a pessoas sem número de identificação fiscal associado, incluindo beneficiários nascidos já depois de ser obrigatório a obtenção do Cartão do Cidadão.
Em resposta, o Instituto de Informática precisou que o NIF passou a ser um campo obrigatório a partir de 2002, aquando da introdução da nova aplicação de cálculo, mas que persiste um universo de pensionistas sem o NIF associado que tem, no entanto, vindo a ser reduzido.
Perante este cenário, o TC recomenda uma maior articulação entre os ministérios do Trabalho e da Justiça para que se garanta que a informação relevante sobre os beneficiários é integrada atempadamente no Sistema de Informação de Pensões.
No contraditório, o gabinete do ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social refere que no Orçamento do Estado para 2019 foi incluída uma norma que visa "habilitar a interconexão de dados" necessários para o registo do óbito no Sistema de Informação da Segurança Social.
Relativamente aos casos que envolvem pessoas a residir no estrangeiro - onde a obtenção de informação em tempo útil se torna mais difícil - o TC recomenda a adoção de medidas, sugerindo a introdução de prova de vida.
Em 2017, a despesa com prestações por morte (incluindo subsídio por morte e reembolso das despesas de funeral), no âmbito do sistema previdencial, totalizou cerca de 2.004 milhões de euros, com a despesa das pensões de sobrevivência a representar 1.903 milhões de euros.
O diploma que regula as pensões de sobrevivência prevê que estas são atribuídas a cônjuges, ex-cônjuges e membros sobrevivos das uniões de facto, sendo pagas por um período de cinco anos se o beneficiário tiver menos de 35 anos à data do óbito do outro elemento do casal.
O TC sublinha que nas uniões de facto "o atual modelo de atribuição" destas pensões tem elementos "que dificilmente são passíveis de controlo", uma vez que a união de facto não tem de ser registada, ainda que deva ser provada --através de uma declaração da junta de freguesia.
Recomenda, por isso, também melhorias na verificação das uniões de facto até porque, a informação disponível à data de setembro de 2018 revelou que nos casos examinados, as pensões de sobrevivência mantinham-se ativas apesar de já não cumprirem requisitos para tal, resultando num pagamento indevido médio ao longo de 32 meses.
Conosaba/Lusa